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sexta-feira, 31 de maio de 2024

Um almoço tardio


Ela estava à sua espera. Deambulava de um lado para o outro, com os nervos à flor da pele, o copo de Martini na mão direita, quase com vontade de o atirar ao chão. Não podia esperar mais. Eram quase horas do almoço, tinha tudo pronto para o receber, mas ele estava demasiado atrasado e nem dissera nada.

Fora à janela mais do que uma vez espreitar se algum carro tinha chegado, algum movimento que lhe dissesse algo sobre ele, mas nada. Estava cada vez mais impaciente, quase a explodir de raiva por sentir que tudo começava a correr mal e que os seus planos estavam a sair furados.

Tinha vestido uma saia de seda vermelha, com flores e botões até abaixo, para se poder desabotoar tudo mais facilmente; estava a ver que se não seria precisa usar esse estratagema.

Sentia-se a ferver por dentro, desejosa de o ver a seu lado, de o abraçar e beijar. Era das raras oportunidades que lhe surgiam de ter alguém perto dela para a seduzir, para lhe dar o conforto e o prazer que tanto desejava, mesmo por uma noite que fosse.

Poder-se-ia sentir mal, uma rameira da pior espécie, ou uma refinada prostituta, que isso pouco lhe importaria neste momento. Queria ama-lo, senti-lo dentro de si para saciar a sua fome de amor, a sua tão desejada hora de um romance ardente e não podia falhar nada. Revia todos os pormenores e tudo lhe parecia estar operacional.

Conhecera-o pela Internet, falavam-se frequentes vezes e até chegaram a ver-se pessoalmente. Pouco se conheciam intimamente. Eram apenas bons amigos, mas as conversas foram-se alongando de dia para dia e o interesse um pelo outro começava a evidenciar-se e chegaram mesmo a falar de relações duradouras, de uma simples aventura sem compromisso, de necessidades íntimas, de sexo.

Por esse facto imaginava-o na sua frente a abraçar-se a ela com fervor e a beijar-lhe esses seus lábios sensuais num voluptuoso e longo beijo que a faria derreter de desejo. E sem dar conta já se via a desabotoar os botões da saia, encostada às costas do sofá e a abrir ligeiramente as pernas, como se ele ali estivesse. Quando deu conta de si tinha a saia completamente aberta, as pernas afastadas e dois dedos da sua mão direita percorriam ligeiramente a sua cuequinha preta.

Bateram à porta. Os seus olhos abriram-se de par em par e o coração bateu-lhe ligeiramente mais forte. Afinal nem tudo estaria perdido; houve apenas um contratempo de última hora e tudo estava normalizado. A tarde seria óptima, podiam jantar fora e teriam uma noite fabulosa. Talvez ainda quisesse almoçar e provar aquele vinho que comprara na loja da especialidade e que julgara óptimo para a ocasião, muito embora não fosse muito conhecedora de vinhos.

Foi abrir. Diante de si o homem que a fizera esperar e desesperar surgia-lhe com um bouquet de rosas vermelhas, que lho apontou de imediato à cara, como um pedido de desculpas e esperou. Por instantes não proferiu uma palavra, mas ao fim de esperar dela um sinal, ou uma resposta que fosse, acabou por lhe confessar a sua demora.

- Tive um acidente pelo caminho. A estrada ficou completamente bloqueada, não tive qualquer hipótese. Desculpa. – Justificava-se ele com sorriso e um olhar meigos na face.

Ficou a olhá-lo algum tempo antes de o mandar entrar. Depois, como que se tivesse esquecido, soltou um ah de espanto, pegou nas rosas e fê-lo entrar.

- Ainda queres comer? – Perguntou ela.

- Claro! Ainda não almocei. – Respondeu numa voz suave.

- Preparei um petisco delicioso…espero que gostes! – Disse ela sorridente.

O seu olhar parecia brilhar ao vê-lo sorrir. Mandou-o entrar. Depois, ainda debaixo do mesmo entusiasmo, ofereceu-lhe um Martini e acompanhou-o na bebida, acrescentando uma casca de limão nos dois copos. Retirou-se para a cozinha, enquanto ele aguardava na sala, sozinho, a olhar para as paredes e os móveis e a cruzar as pernas.

- Põe música se quiseres! Estão aí na estante. – Disse ela em voz alta. - Escolhe o que te apetecer.

A mesa da sala estava posta. Um arranjo de rosas vermelhas e uma fina vela branca no centro davam um pequeno toque romântico. Os pratos brancos, quadrados, a marcar uma certa modernidade, sobressaiam da toalha de linho. Os copos, que embora não fossem de cristal, eram de marca, mas delineavam uma decoração simples e a condizer com o ambiente.

De repente apareceu na sala empurrando um carrinho de serviço de mesa, a travessa a fumegar, a terrina da salada ao lado e uma garrafa de vinho em baixo. Acendeu a vela do castiçal com as rosas vermelhas e serviu o rapaz. Delicadamente o jovem abriu a garrafa do vinho, serviu-lho e serviu-se.

A refeição decorreu calma, entre olhares cúmplices e afagares de mãos e quase sem uma única troca de palavras. Pouco havia a dizer. Da parte dela havia muito mais a fazer e muita ansiedade no seu coração. Sentia-se isso e nos olhos, como se quisesse devorar o homem e esperava dele uma palavra que fosse que definisse a situação.

No fim fizeram um brinde com um entrelaçar de braços e copos, entre olhares cúmplices e maliciosos, sem que as palavras fossem necessárias para qualquer coisa.

- Gostaste? – Perguntou ela.

- Sim, estava delicioso. – Respondeu o homem.

- Tchim, tchim! – Pedia ela novo brinde.

Os copos tilintaram uma vez mais. Quase sem dar tempo de proferir qualquer palavra, o olhar dela cruzou-o e esperou dele o beijo há muito desejado. Sem demora, com o calor do corpo a começar a aquecer e sem quase se controlar abraçou-o. Encostou as suas pernas às dele, de corpos colados, o ambiente esquecido em redor, ofereceu-se a ele e entregou-se.

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