quinta-feira, 22 de agosto de 2024
domingo, 4 de agosto de 2024
Menino de rua
O
dia estava frio, mesmo frio e por isso decidi vestir-me mais a rigor, uma
camisa tipo pescador, uma camisola de lã de gola alta, o meu casaco de Inverno
e segui caminho.
Na
rua os vendedores ambulantes do costume, os ciganos, o homem das castanhas, os
pedintes habituais. A estes olho-os com alguma lástima, sentindo-me um sortudo
pela minha condição, que para mim poderá ser mísera, mas que, concordo
plenamente, existem pessoas bem piores do que eu, cuja existência se resume a
um vegetar diário que só deus sabe porquê.
Nestas
ocasiões sigo o meu caminho sem olhar para os lados, só para não dar de caras
com nenhum deles a pedir-me o que não posso e por vezes não quero dar. Oiço
histórias de muitos que vivem bem, têm uma boa casa, por vezes carro e andam
nesta vida porque querem e a esses não tenho sequer dó.
Num
destes dias em que saí de casa, por sinal muito mais cedo do que o habitual,
deparei com uma criança que repetia, quase que ininterruptamente:
-
Dêem-me alguma coisinha, tenho fome!
A
princípio não liguei, confesso, mas depois de ter parado por alguns momentos a
posicionar-me na questão e do miúdo me puxar literalmente pela calça, acabei
por lhe dar uma moeda.
- Pague-me uma sopa, senhor! – Pediu
o garoto.
Tocou-me
cá dentro algo que nunca antes sentira, algo que me sensibilizou e me fez levar
o garoto ao café mais perto e pedir uma sopa e um pão. Observei-o atentamente a
devorar a sopa e a comer com satisfação o pão. Dei por bem empregue o dinheiro
que paguei. Acabei por beber um café, é claro, mas apenas para não estar só a
olhá-lo.
Um
outro que pedinchava o mesmo a quem entrava no estabelecimento dirigiu-se a uma
senhora que bebia uma bica ao balcão:
-
Pague-me um bolo.
A
senhora, vendo o meu gesto quis imitar-me. O garoto mal ouviu a palavra sopa
respondeu num ápice:
-
Coma-a você! – E saiu disparado porta fora, rogando pragas à bondosa senhora.
Prémio de Participação 1º
Jogos Florais 2002